Antonio Darcio Valerio Filho*

O setor de Seguros, outrora um bastião de estabilidade, está em plena metamorfose. As tradicionais bases de dados históricos e padrões previsíveis já não são suficientes para avaliar riscos e precificar apólices em um mundo cada vez mais complexo e imprevisível. A era da transformação digital chegou, e com ela, a necessidade de repensar estratégias e abraçar a inovação.
No Brasil (e no mundo) as seguradoras enfrentam uma série de desafios: o aumento dos custos de servir, a frequência crescente de eventos climáticos extremos, a demanda por serviços rápidos e personalizados, e a crescente sofisticação dos riscos cibernéticos. Esses fatores ameaçam a estabilidade do setor, exigindo uma abordagem proativa e estratégica.
Nesse cenário, a integração entre nuvem, análise de dados e Inteligência Artificial (IA) emerge como um fator crítico para o sucesso. Assim como ocorreu com os demais players do setor financeiro nos últimos anos, o setor de Seguros também enfrenta um momento de consolidação, com aquisições de carteiras e saída de algumas empresas do mercado brasileiro. No entanto, a falta de integração entre os sistemas dessas companhias tem criado desafios operacionais significativos.
Historicamente, seguradoras operaram com dados fragmentados em silos vinculados a produtos específicos, dificultando a construção de uma visão unificada do cliente. Para resolver essa questão, a nuvem surge como um habilitador essencial. Ao migrar suas bases de dados para a nuvem e modernizar seus sistemas, as seguradoras podem consolidar informações dispersas e criar uma estrutura integrada, preparando o terreno para a aplicação de IA de maneira mais eficaz.
Atualmente, o uso de IA no setor de Seguros ainda é incipiente devido à fragmentação dos dados e a definição correta dos casos de uso que gerem valor ao negócio. Com informações dispersas e pouco estruturadas, a IA tem dificuldade justamente em gerar insights valiosos. Contudo, algumas iniciativas já começam a despontar. Um exemplo foi o anúncio de uma grande organização do setor sobre o uso de IA na redação de cláusulas contratuais. Além disso, a IA também tem sido utilizada para otimizar processos internos e melhorar a eficiência operacional, desde o atendimento ao cliente até a gestão de sinistros.
Uma vez estabelecida a fonte única da verdade em nuvem, abre-se o caminho para análises de dados verdadeiramente transformadoras. As seguradoras podem agora extrair insights valiosos de seu patrimônio informacional, identificando padrões de comportamento, tendências de sinistros e oportunidades de cross-selling que permaneciam invisíveis quando os dados estavam fragmentados. Este novo paradigma analítico permite avaliações de risco mais precisas, precificação personalizada e, consequentemente, produtos mais alinhados às necessidades específicas de cada perfil de cliente.
A integração de plataformas tem sido uma demanda crescente no setor. Algumas empresas estão apostando em soluções como Salesforce e ServiceNow, que funcionam como plataformas de serviço (PaaS) para melhorar a gestão de processos e a experiência do cliente. Essas ferramentas permitem uma visão mais ampla e interconectada, garantindo que todas as etapas, do back-office ao atendimento, funcionem de maneira mais fluída e eficiente.
Entretanto, um dos principais desafios para a adoção massiva da IA nas seguradoras é a questão cultural e organizacional. O setor é tradicionalmente avesso a riscos, possuindo uma abordagem cautelosa na adoção de novas tecnologias, principalmente quando envolvem riscos de “alucinações” da IA, que poderiam prejudicar a reputação das empresas. Muitas seguradoras ainda adotam uma postura conservadora, esperando que outras empresas testem e validem soluções antes de implementá-las.
Para superar essa barreira, é necessário um esforço de mudança de mentalidade dentro das organizações. É fundamental adotar uma abordagem mais aberta à experimentação e à inovação, permitindo testes controlados e ajustes conforme necessário. A transformação digital das seguradoras depende tanto da evolução tecnológica quanto da disposição das lideranças em abraçar um novo paradigma.
O setor de Seguros está em um ponto de inflexão e o próximo passo passará pela modernização em nuvem, dados e IA. Para que essas tecnologias tragam impactos reais, é essencial que as empresas abandonem modelos fragmentados e apostem na consolidação de dados e na automação inteligente. A jornada de transformação pode ser complexa, mas as recompensas são significativas: maior eficiência operacional, melhor experiência do cliente, maior capacidade de gestão de riscos e um futuro mais resiliente.
*Antonio Darcio Valerio Filho é Business Vice President da GFT Technologies no Brasil