Agronegócio foi um dos setores que menos sofreu na pandemia; atuação dos seguros continua com crescimento expressivo
Thais Ruco
O agronegócio se posicionou como uma importante âncora para a economia brasileira durante a pandemia. De acordo com o relatório do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada, da Esalq/USP, em parceria com a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), o PIB do agronegócio cresceu 10,79% no período de janeiro a setembro de 2021 comparado ao mesmo período de 2020, e estima-se que represente em torno de 28% do PIB total em 2021, atingindo recordes de volume e de receita com as exportações.
“Este desempenho está diretamente ligado ao aumento da demanda mundial por alimentos e também à desvalorização do real frente ao dólar, fazendo com que haja valorização do produto e tornando seu preço mais competitivo (em dólar)”, afirma Catia Rucco Rivelles, superintendente de Agronegócios da Mapfre.
Para ela, o aumento dos prêmios do seguro agrícola está relacionado à diversos fatores, que devem seguir impulsionando o crescimento também em 2022.
Confira os fatores que impulsionam o crescimento do seguro agrícola
Aculturamento do seguro agrícola | comparado a outros países do mundo, o seguro agrícola no Brasil é muito recente e vem passando por um processo de evolução e consolidação. A importância deste tipo de proteção é evidente, sendo assim, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) vem ano após ano incentivando a contratação por meio da subvenção ao prêmio de seguro rural (PSR), e, em conjunto com as seguradoras, está facilitando o acesso do produtor às informações do seguro e promovendo a aproximação entre produtores rurais, corretores de seguro e seguradoras.
Câmbio | O aumento do valor do dólar, que consequentemente elevou o valor das commodities, fazendo com que os valores segurados ficassem em média 30% superior ao da safra passada.
Clima | Outro fator que foi determinante no aumento dos prêmios de seguro agrícola é o ano climaticamente desfavorável para região sul do Brasil. Passamos por um período de La Niña, que fez com que as chuvas se tornassem mais escassas e irregulares no Sul – o que fez com que a procura pelo seguro crescesse consideravelmente nessa região.
Histórico de perda anterior | Os produtores passaram por uma safra de inverno catastrófica, fazendo com que buscassem mitigadores de risco para a safra de verão.
“Além do critério inflacionário, tivemos uma valorização das commodities de exportação que também afetou outras cadeias derivadas, como a de proteína animal, por exemplo, que depende da produção de grãos. De certa forma, podemos dizer que o mercado de seguros em agronegócio se beneficiou de outras operações que não vieram bem ao longo desses últimos dois anos e capturou esta oportunidade da força comercial do mercado de seguros com corretores e canais de distribuição”, comenta Glaucio Toyama, head de Agronegócios Latam da Swiss Re Corporate Solutions.
A agricultura é tão importante para o País que qualquer crescimento ou perda de produção tem impacto direto no PIB brasileiro. “Por conta dos recentes eventos climáticos, existe um risco que o volume de produção seja menor do que os praticados em anos anteriores, mas isso pode ser compensado por conta de um aumento nos valores das safras e de uma demanda maior pelos produtos. E os constantes investimentos dos produtores nesta área devem manter o protagonismo do setor para a economia brasileira”, diz Joaquim Neto, superintendente de Produtos Agro da Tokio Marine Seguradora.
“O agronegócio brasileiro não sofreu as últimas crises da mesma forma que os outros setores. Exemplo disso são a crise de 2008 e a pandemia iniciada em março de 2020. Nas duas, o Agronegócio continuou crescendo”, afirma José Maria Cullen, head Latin America da Green Triangle, empresa de tecnologia para o agronegócio.
Da mesma forma, o volume de prêmio de seguro rural tem crescido durante a pandemia. “Os motivos são vários: o preço das commodities, principalmente, da soja, milho e trigo estão em valores recordes e, consequentemente, teve um aumento das importâncias seguradas e dos prêmios; e o governo tem aumentado os recursos para apoiar o seguro rural. A pergunta é se esse crescimento foi acompanhado de investimento em conhecimento, profissionais e tecnologia”.
Para Karen Matieli, sócia da Denner Agro Corretora de Seguros e coordenadora da Comissão Rural do Sincor-SP, é sabido que o agro brasileiro que produz, exporta e abastece o mercado interno é um dos principais fatores de sustentação da economia do País, alavancando os números de forma surpreendente e recuperando parte do estrago causado pela pandemia. “O produtor brasileiro segue dando show em produtividade e eficiência”.
Cenário pós-pandemia
Uma das dificuldades mais evidentes que a pandemia impôs ao setor foi o contato com o cliente, em meio ao distanciamento social. “A parte da prestação de serviço, incluindo a apuração de perdas quando ocorre o evento, no geral é feita por terceiros e ficou claro o gargalo na oferta de peritos disponíveis no mercado. Ainda que exista a possibilidade de perícia virtual ou por satélite, são oportunidades que ainda precisam ser desenvolvidas, para uma implantação ampla”, analisa Toyama.
“A impossibilidade de encontros presenciais e a não realização de feiras do agronegócio são alguns dos pontos que podemos destacar. Principalmente as feiras, que sempre foram momentos de geração de novos negócios e esse formato presencial ficou impossibilitado. Especificamente para o setor de seguros, a dificuldade de peritos chegarem a determinadas regiões também pode ser ressaltada. Isso também atingiu os corretores, que precisaram se adaptar para atender seus prospects e clientes”, completa Joaquim Neto.
Catia Rucco conta que, no início da pandemia, houve algumas situações de peritos impedidos de entrar em alguns municípios devido a barreiras sanitárias, mas o problema foi rapidamente sanado. Ela lembra que foi necessário reajustar alguns procedimentos e avançar de forma bastante rápida com alguns projetos que eram a médio prazo, como, por exemplo, a vistoria prévia remota para os seguros patrimonial rural, que foi implantada durante a pandemia.
Já a corretora Karen Matieli aponta que os custos de produção aumentaram significantemente em relação aos insumos, transportes, maquinários ou seja, custos de produção foram diretamente impactados durante a pandemia. “Questões como consumo de subvenção em virtude do aumento de taxas e custos de produção, conservadorismo das seguradoras em relação ao nível de produtividade garantida, mudanças climáticas e qualificação dos corretores são temas imprescindíveis para discussão e acompanhamento do setor como um todo”, diz.
José Maria Cullen explica que hoje as coisas têm se normalizado. “Porém, com a altíssima sinistralidade do milho safrinha 2021 e a de verão 2021/22 o mercado está enfrentando novos desafios: a falta de peritos treinados para atender à alta demanda de sinistros; a falta de capacidade de resseguro para atender as novas safras, a necessidade de aprimorar as ferramentas de avaliação de risco com o fim de minimizar a seleção adversa, a qual ficou evidente no último ano”.
Apesar do grande crescimento do seguro agrícola durante os últimos anos, o nível de penetração ainda é baixo – não mais do que 20% da área agrícola total é segurada. Quer dizer que existe um universo grande de produtores rurais que não têm seguro. “O histórico mostra que corretores de seguros que têm se especializado no ramo agrícola e prestam um serviço profissional de alta qualidade são bem-sucedidos”, aponta Cullen. Karen Matieli reforça que existe um mercado enorme para ser atendido com qualidade na prestação de serviço que hoje ainda é muito carente, já que a maioria dos corretores tem seu foco nos produtos mais convencionais.
Estudando e compreendendo as especificidades do segmento, o corretor de seguros pode ter sucesso no agrobusiness. “A construção da base de dados e o entendimento de como é o funcionamento do negócio também devem estar incluídos na formação, além de enxergar o momento oportuno e reconhecer as características de uma parceria público-privada”, orienta Toyama.
“O corretor, nas mais diferentes áreas, demanda por treinamento, conhecimento, modernização e de atenção”, completa Joaquim Neto, lembrando que existe um potencial de crescimento para a modalidade do seguro agrícola, mas que os produtores desse setor estão cada vez mais exigentes porque investem muito e querem produtos e um atendimento à altura desses investimentos e da importância do setor.
Conteúdo da edição de março (240) da Revista Cobertura